quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Patologia das Glândulas Salivares

 

INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES


As glândulas salivares são sede de inúmeros processos neoplásicos benignos ou malignos e também de processos não neoplásicos que simulam lesões tumorais nestas glândulas .As glândulas salivares são divididas em maiores e menores. As glândulas maiores são formadas por 3 pares, sendo as parótidas, as submandibulares e as sublinguais (Figura 1).
As parótidas são as maiores glândulas salivares, pesam de 25 a 30 g, estão localizadas na lateral da face, anterior ao tragus, ao redor do ramo da mandíbula e drenam através do ducto de Stensen, que tem sua abertura na mucosa jugal próxima ao 2º dente molar superior.
O VII par craniano ou nervo facial, responsável pela mímica da face, atravessa a parótida e a divide em lobo superficial (com cerca de 80% do seu volume) e profundo (com os 20% restantes) (Figura 2).
As glândulas submandibulares estão no trígono submandibular, abaixo da mandíbula entre os ventres anterior do músculo digástrico e drena pelo ducto de Wharton, que desemboca lateralmente ao freio lingual.
As glândulas sublinguais são as menores entre as maiores e estão localizadas no assoalho da boca e drenam para os ductos de Bartholin (principal), que desembocam ao lado do ducto de Wharton e pelos ductos de Rivinus (menores), que se abrem abaixo da língua.
As glândulas salivares menores são aproximadamente 600 a 1.000, estando localizadas em todo trato aerodigestivo superior, desde a cavidade nasal até a laringe.
A produção diária de saliva é de aproximadamente 1.500 mL, sendo cerca de 90% produzida pelas parótidas e submandibulares, 5% pelas glândulas sublinguais e 5% pelas glândulas salivares menores.





ACHADOS CLÍNICOS


O aumento das glândulas salivares se traduz em processos neoplásicos ou não neoplásicos que geram edema e intumescimento, simulando, assim, um tumor.
Por meio da história, tenta-se diferenciar entre processos benignos, malignos ou inflamatórios. Muitas vezes, mesmo com a história e o exame físico completo do doente, só se atinge o diagnóstico final pela análise patológica.

1.    Idade do doente: doente mais jovem tem maior chance de ter processos não neoplásicos, como uma parotidite viral.
2.     Tempo de evolução: processos neoplásicos geralmente têm histórias mais longas, ao passo que os não neoplásicos duram algumas semanas.
3.    Sintomas sistêmicos: febre, principalmente associada a um rápido aumento das glândulas, leva a hipóteses de doenças inflamatórias.
4.   Mudança no padrão de evolução do tumor: é sinal de alerta para possível diferenciação maligna do tumor.

Dor e Edema

Tumores geralmente são indolores, enquanto que processos agudos, como as parotidites, costumam gerar dor. Nas sialolitíases, dor e edema geralmente ocorrem de forma associada pela obstrução de ductos, especialmente quando ocorre estímulo à salivação, por exemplo, durante a alimentação.

Xerostomia

Pode ser um sinal ou um sintoma. A boca seca pode estar relacionada ao uso de várias drogas ou associada a síndrome de Sjögren, desidratação, diabetes insípido ou uremia.

Alterações no Sabor

A secreção purulenta produzida na glândula afetada pode dar um sabor desagradável aos alimentos, estando geralmente associada com sialoadenites.

Acometimento Uni ou Bilateral

Quando há uma única glândula acometida, há maior probabilidade de se tratar de sialolitíase ou de tumor.

EXAME FÍSICO

O exame das glândulas salivares compreende examinar toda região cervicofacial. As etapas de inspeção, palpação uni ou bimanual, juntamente com a oroscopia e a visualização dos orifícios dos ductos, está inclusa no exame.
É preciso posicionar-se em frente ao paciente observando assimetria, mudança na coloração, massas pulsáteis ou móveis à deglutição. Os achados clássicos sugestivos de tumores de parótida são o apagamento do ângulo da mandíbula e a elevação do lóbulo da orelha. Na glândula submandibular, pode-se notar um aumento da região posterior ao mento e medial ao ângulo da mandíbula, que, por muitas vezes, é difícil de distinguir de uma linfonodomegalia cervical.
A oroscopia deve ser realizada à procura de lesões na cavidade oral e observando-se a simetria dos orifícios dos ductos, sinais de oclusão, abaulamentos de assoalho ou mucosa jugal e aspecto da saliva. O abaulamento medial da parede lateral da orofaringe sugere um tumor de lobo profundo de parótida. Deve-se realizar palpação minuciosa da região cervical procurando caracterizar o tumor em relação a sua consistência, aderência a outras estruturas e linfonodomegalias cervicais. Também é feita a palpação da cavidade oral de forma bimanual com uma mão na região cervical e o dedo da outra mão no assoalho da boca, para melhor exame da glândula submandibular, podendo-se, assim, palpar cálculos. Pressionam-se também as glândulas parótidas e submandibulares durante a oroscopia, observando as características da saliva expelida nos orifícios das respectivas glândulas.

Localização do Tumor

Como regra, pode-se associar o risco de um tumor ser benigno com o tamanho da glândula acometida: quanto maior a glândula, maior a chance de o tumor ser benigno. Cerca de 80% dos tumores de parótida e 50% da submandibular são benignos.

Consistência do Tumor

Tumores mais duros e fixos a estruturas profundas ou à pele têm maior chance de serem malignos.

Paralisia ou Paresia da Face

Pode refletir invasão neural do tumor, principalmente do nervo facial na parótida ou do nervo marginal da mandíbula no acometimento da glândula submandibular, sendo quase sempre neoplasia maligna.

Presença de Tumores que Drenem para Linfonodos Intra ou Periglandulares

Não é incomum a glândula parótida e a glândula submandibular serem sede de tumores metastáticos. Assim, em caso de lesões de parótida, deve-se examinar a face do doente à procura de lesões de pele como CEC e melanomas, e, na glândula submandibular, deve-se procurar por tumores de cavidade oral.

EXAMES COMPLEMENTARES

 

Exames Laboratoriais

Não há uma sequência específica de exames para o diagnóstico em glândulas salivares. Esses exames devem ser solicitados com base nas hipóteses diagnósticas. A amilase elevada pode auxiliar no diagnóstico diferencial da parotidite epidêmica, mas também pode ser encontrada na sialolitíase. Sorologias específicas podem ser úteis em casos de suspeita de CMV ou parotidite por HIV. Doenças como diabetes, Cushing, cirrose, hipovitaminose A, pelegra, beribéri, desnutrição, atrofia testicular e hipertireoidismo também podem levar ao aumento das glândulas salivares, possuindo testes específicos para seu diagnóstico. Na síndrome de Sjögren, realizamos eletroforese de proteínas, taxa de sedimentação de eritrócitos, fator antinuclear e fator reumatoide.
Nódulos de parótida sempre são tratados cirurgicamente, por isso alguns autores advogam que um nódulo de parótida pequeno, não aderido e sem sinais de invasão neural em pacientes jovens não necessita de nenhum exame de imagem ou citológico previamente à cirurgia.

Ultrassonografia (USG)

É um exame de imagem muito útil e não invasivo, que revela facilmente se há ou não nódulos e se estes são císticos ou sólidos. Neoplasias geralmente aparecem como nódulos sólidos, exceto o tumor de Whartin.

Radiografia de Face ou Panorâmica

Nas sialolitíases submandibulares, o cálculo é radiopaco na maioria das vezes, ocorrendo o contrário com os cálculos de parótida.

Sialografia

É um exame no qual se injeta solução contrastada pelo óstio do ducto salivar, revelando a anatomia e possíveis cálculos ou estenoses na glândula e na árvore ductal. É importantíssimo na suspeita de sialolitíase, embora pouco elucidativo para tumores. Deve-se aguardar a passagem da fase aguda, com melhora dos sinais flogísticos, para sua realização.

Tomografia Computadorizada (TC)

É o padrão-ouro para tumores de parótida, mostrando sua extensão e possível acometimento do lobo profundo. Pode, ainda, mostrar sinais de invasão de estruturas circunvizinhas ou presença de linfonodomegalias suspeitas.

Ressonância Nuclear Magnética (RNM)

Tem menor contraste entre o tecido tumoral e o tecido normal do que a TC, porém permite estudar os nervos e seus forames com maior precisão.

Punção Aspirativa por Agulha Fina (PAAF)

Apesar de todo nódulo de parótida ter tratamento cirúrgico, a PAAF é útil para tentar definir a histologia do tumor, o que, às vezes, não é atingido, mas a diferenciação entre maligno e benigno é mais frequente e tem grande valia no planejamento da extensão da operação. Também consegue identificar lesões inflamatórias. É importante ressaltar que este exame somente tem boa especificidade e sensibilidade nas mãos de citopatologistas experientes.

Biópsia Incisional

Conduta de exceção, devendo ser realizada apenas em tumores de glândulas salivares menores ou tumores de glândulas salivares maiores, já ulcerados para a pele.

Cintilografia com Tecnécio

Há hipercaptação em tumores de Whartin mostrando um “nódulo quente” de parótida.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

Doenças Infecciosas

·      Parotidites virais;
·      parotidites crônicas;
·      parotidites sifilíticas;
·      parotidite tuberculosa;
·      doença da arranhadura do gato.

Tumores Benignos

·      Adenoma pleomórfico;
·      tumor de Whartin;
·      oncocitoma;
·      adenomas monomórficos;
·      hemangioma e linfangioma.

Tumores Malignos

·      Carcinoma mucoepidermoide;
·      carcinoma adenoide cístico;
·      carcinoma de células acinares;
·      carcinoma ex-adenoma pleomórfico;
·      carcinoma epidermoide.

Sialolitíase e Sialoadenites


Doenças Inflamatórias

·      Síndrome de Sjögren;
·      doença de Mikulicz;
·      sarcoidose.

Hipertrofia Glandular

·      Alterações metabólicas;
·      desnutrição;
         ·      alterações endócrinas